Crítica | Do Jeito Que Elas Querem 2 remove conflito e deixa suas estrelas brilharem
Jane Fonda e cia. vendem bem essa mistura de cinema cartão-postal e lemas de auto-ajuda
Fonte: Caio Coletti – Omelete
Diz o manual de roteiro que o elemento essencial para contar uma história é o conflito. Um personagem quer uma coisa, e há alguém ou algo em seu caminho; para superar esse obstáculo, ele terá que abrir mão de elementos importantes de si e de sua vida, se provar preparado para lutar (física e/ou emocionalmente) pelo que quer. Bom, alguém esqueceu de avisar tudo isso para Bill Holderman e Erin Simms, os roteiristas de Do Jeito Que Elas Querem – O Próximo Capítulo, continuação em que as quatro amigas do filme original viajam para a Itália realizar um velho sonho e, de quebra, dar uma despedida de solteira memorável para uma delas.
“Conflito” é uma palavra que não existe no vocabulário narrativo de O Próximo Capítulo. É claro que cada uma das personagens tem problemas, mas o filme garante que elas nunca se metam em embates de interesses e ou encontrem verdadeiras inconveniências. A bagagem das quatro foi roubada em uma estação de trem? Tudo bem, há dinheiro para comprar roupas novas! O marido de uma delas ressente a vigilância excessiva da esposa após uma emergência médica? Bom, nada que não se resolva com uma conversa sincera entre amigas e uma aparição surpresa do cônjuge na parte final da viagem. Toda complicação de trama é resolvida assim, sem nenhum drama de verdade.
Daí que a 1h48 de duração deste novo Do Jeito Que Elas Querem pode soar excessiva, mas na prática o filme toma a decisão acertadíssima de confiar em diálogos afiados e no timing cômico de suas quatro protagonistas para carregar o espectador por uma viagem cinematográfica tão agradável quanto um passeio pelos canais de Veneza. Assim como no primeiro filme, quem mais se destaca na forma de lidar com o texto é Candice Bergen – na pele da secamente divertida Sharon, ela suaviza o que poderia ser uma barragem irritante de piadinhas irônicas com seu charme debochado e sua aproximação desavergonhada da comédia física.
A surpresa neste segundo longa, enquanto isso, é que Diane Keaton tem espaço para brilhar como há muito tempo não faz nos cinemas. Aqui, da usual rotina de senhorinha atrapalhada que ela tem repetido em seus últimos filmes, da excentricidade estilosa que tem definido da sua persona cômica já há muito tempo, emerge também uma personagem de fragilidade emocional latente, responsável por evocar muito da ternura que o espectador acaba sentindo pela jornada de atualização pessoal conscientemente utópica pela qual as protagonistas passam – afinal, dessa vez elas estão lendo O Alquimista,de Paulo Coelho.
O papo aqui é sobre tomar as rédeas do próprio destino, não deixar o medo apagar sua consciência de si mesmo, e outros clichês tão verdadeiros quanto inconsequentes diante da complicação do mundo real. O Próximo Capítulo, no entanto, sabe se posicionar bem como um espelho idealizado desse mundo, seja na forma como a cena inicial reflete as transformações tectônicas dos anos pandêmicos ou na observação arguta que usa para desenhar seus personagens-caricatura, fazendo-os ao mesmo tempo impossivelmente bem resolvidos e imediatamente reconhecíveis.
Quem atinge e mantém esse balanço é o elenco, é claro, deixando o diretor Holderman na posição invejável de observador de talentos e virtudes: o trabalho dele, em suma, é mostrar Andy Garcia sendo absurdamente charmoso com uma Diane Keaton nervosamente efervescente; captar os sorrisos e olhares trocados entre Bergen e Jane Fonda (ela chama a sua velha amiga de “slim”, ou “magrela”, em um dos detalhes mais adoráveis do filme); registrar a beleza cuidadosamente manicurada dos espaços italianos luxuosos pelos quais a história se desenvolve; e, por fim, comunicar ao espectador que este é um filme que não tem medo do ridículo, mas que não se encara como uma grande piada autoconsciente.
Ao invés disso, Do Jeito Que Elas Querem – O Próximo Capítulo pede que nos aproximemos dele buscando conforto, e é exatamente conforto que o filme nos entrega. Faz mal acreditar por pouco menos de 2h que todos somos capazes de mudar a trajetória de nossas próprias vidas, e que todas as complicações nelas podem se resolver sem a necessidade de quebrar relações ou corações? Talvez até faça, ao longo prazo. De imediato, porém, a companhia é boa demais para recusar.