Fonte: Vitor Velloso – Vertentes do Cinema

“Filho-Mãe” chega ao Reserva Imovision avisando aos espectadores que carreguem um lenço durante a projeção. O drama de Mahnaz Mohammadi traz Leila (Raha Khodayari) como protagonista, em meio a uma série de repressões que vão da exploração de trabalho ao machismo. O cotidiano se torna a nota principal das dificuldades da personagem, que assume dezenas de “funções” a cada dia, na tentativa de sobreviver e sustentar seus filhos. Conforme os obstáculos passam a coincidir, o impedimento de Leila em assumir suas responsabilidades com sua família vai crescendo e ela precisa tomar uma decisão: filhos, trabalho ou servir a um possível marido que recusa a família da protagonista (por ser viúva e as crianças não serem dele).

Está claro que boa parte das opções não podem ser categorizadas sem o contexto da narrativa, em todas as situações, a corda está no pescoço. Sabendo do alto risco de demissão e a fábrica em crise, optar pela manutenção conservadora pode ser uma saída financeira, mas teria de abrir mão de seus filhos. Toda essa tensão que envolve distintas tomadas de decisões, levam à uma mudança na estrutura dramática do filme, a mudança do eixo central da representação. Essa transição é menos orgânica que parece, à primeira vista, mas traduz a brutalidade da realidade que envolve o pequeno Amir (Mahan Nasiri), que da noite pro dia, passa a ser reprimido com intensidade ímpar. Essa relação imediata criada pela dialética desse protagonismo acaba formalizando uma relativa analogia já exposta no título. “Filho-Mãe” assume a violência e as manutenções conservadoras como uma questão estrutural de uma sociedade que não pode ser debatida na perspectiva ocidental, como muitos podem propor.

Essa construção não é inconsciente de suas decisões, ao assumir um certo vilanismo de determinados personagens, agentes alienados e o patrão que está a serviço das classes dominantes, sentindo-se acuado pelas revoltas constantes dos operários. O grande barato aqui é a maneira que a direção encontra para provocar certas emoções no público. Por vezes, há um certo apelo para fortes impactos imagéticos que tornam a experiência mais arrastada que deveria, pois seu apreço em criar grandes composições capazes de assimilar essa melancolia a partir da repressão, faz com que o projeto saia do drama cadenciado ao dramalhão pouco convincente em alguns momentos. Ainda que exista um claro rigor na dinâmica interna das cenas, um certo exagero das tomadas de decisão diante dessas provocações, faz o andamento ir pras cucuias. Em certo ponto, há um ciclo que vai se repetindo, com aumento de repressões, tristezas, violência e todo tipo de caráter reacionário da sociedade, agora cada vez mais enclausurada (algo que a direção assume bem), que não consegue sair de um certo vácuo ali deixado.

Se “Filho-Mãe” tivesse a oportunidade de utilizar desse esgotamento emocional em espaços fechados, sem recorrer a uma certa forma programática, o resultado seria um impacto que não teria de ceder ao famoso plano de reencontro que simula um certo respiro para o protagonista. Em suma, o que acontece com o passar do tempo, é que aquele rigor que com pequenos movimentos de câmera consegue esgarçar a moral conservadora nas violências do dia-a-dia e na luta por sobrevivência, vai se diluindo e cedendo ao conformismos das cores azuis e ao padrão das representações. É uma pena, pois os minutos iniciais do longa, são particularmente vigorosos. Possivelmente parte da atenção que consegue no início da projeção, vai se perder com sua progressão, consequentemente alguns espectador não estarão tão dispostos à uma certa manipulação formal que Mahnaz emprega, porém, os que conseguirem, terão de sustentar um peso que o protagonista não consegue formular nem em palavras e acaba recorrendo aos cantos inóspitos de seus sonhos.

“Filho-Mãe” é uma adição de catálogo que não engrandece à ponto do destaque, mas é relevante ao passo que foge um pouco do inglês e francês. Ainda que seja da Europe Media Nest.

Assista ao trailer:

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1 Comentário

  1. Wagner 1 de outubro de 2023

    Não concordo com suas opiniões. Achei o filme ótimo. Muito bem feito e nada arrastado. Perfeito do começo ao fim.