Crítica: Charme de O Menu compensa impossibilidade de conclusão satisfatória
Tensão e ótimos personagens fazem o longa valer por sua jornada
Fonte: Julia Sabbaga – Omelete
É tão fácil se deixar levar pelo clima de O Menu. Seja mesmo antes do filme começar, pela simples aliança de três atores afiadíssimos (Ralph Fiennes, Anya Taylor-Joy e Nicholas Hoult), pela atmosfera imediata de tensão e paródia ou pela gama de personagens rapidamente introduzidos, este é um daqueles filmes de diversão garantida, mas que desperta uma sensação familiar: a previsão de um desfecho potencialmente frustrante. É uma energia que vem lá do começo, talvez pela perfeita analogia que a trama sugere; assim como uma refeição em um restaurante caríssimo, O Menu é lindo, delicioso, e inevitavelmente insatisfatório.
São 12 personagens em uma ilha isolada. Reunidos ao redor do restaurante Hawthorne e a pretensão do chefe Julian Slowik (Fiennes) de entregar o “jantar de uma vida”, os personagens de O Menu são variados tipos de privilegiados da sociedade. Entre foodies, empresários, investidores, atores aposentados e críticos gastronômicos, no entanto, está Margot (Taylor-Joy), nossa representante e outsider, convidada de última hora de Tyler (Hoult) – o maior fã de Slowik no salão – e persistente crítica de todo o absurdo ao seu redor. É em seu embate com Julian que O Menu tira seus melhores momentos, também porque é nestes dois papéis que o roteiro de Seth Reiss e Will Tracy deposita algum mistério.
Isso porque os tipos que preenchem o salão de Hawthorne nunca são exatamente aprofundados, e isso não é deslize do filme de Mark Mylod. Aqui, personagens compõem um microcosmos da elite e, assim como um dos pratos de Slowik, são servidos para serem lentamente devorados. À medida em que o chefe revela o quão sinistra esta noite pretende ser, seus convidados também se apresentam, remetendo a um cenário de Agatha Christie. Em O Menu, assim como em um bom livro de mistério, a diversão é entender quem são aquelas pessoas e que passos de suas vidas os levaram até aqui.
A reunião de super-ricos e a atmosfera de sátira têm tudo para desembocar em crítica, mas O Menu não tem exatamente muito a dizer, e se limita a alfinetar este universo, evidenciando o absoluto desdém que resulta do privilégio absoluto. A falta de discurso social, no entanto, pouco importa para o desenrolar do suspense, porque o longa permite empatia por seus personagens. Ao contrário do que se espera de uma produção do tipo, Mylod constrói a derrocada de O Menu de modo ambíguo; ao mesmo tempo em que você torce pelo infortúnio dos convidados, é impossível passar a trama sem sentir certo amargor pelo destino de cada um.
Confiando em ótimas performances – com destaque para Hong Chau como a impiedosa e hilária Maitre D’ de Julian, e o próprio Fiennes, delicioso de assistir – e diálogos espertinhos, O Menu se encaminha para aquele final que, apesar de coerente, não conclui muito sobre tudo que acabamos de assistir. É um beco sem saída pela impossibilidade de fechar uma viagem fantasiosa como esta. Mesmo assim, O Menu de Slowik nos dá o suficiente para seguir digerindo suas melhores cenas – e, claro, nos deixar desejando por mais.