Crítica | Sempre carismático, Ó Paí, Ó volta tentando abraçar o mundo na sequência
Lázaro Ramos lidera trupe de personagens ainda mais humanos, mas trama não dá conta de tantas urgências
Fonte: Laysa Zanetti – Omelete
Na primeira cena de Ó Paí, Ó 2, Lázaro Ramos sobe a ladeira do Pelourinho trazendo de volta o emblemático Roque. Quinze anos se passaram desde o primeiro filme, mas reencontramos a trupe do cortiço de dona Joana (Luciana Paz) no mesmo lugar, e nas considerações iniciais de Roque permanecem as mesmas inquietações. Ou será que não?
Sem ignorar a sequência para a TV que foi ao ar em 2008, Ó Paí, Ó 2 traz Roque ainda como um carismático cantor em busca de seu lugar ao sol. Agora pai de um menino que segue seus passos, ele acredita que enfim conquistará a fama. Joana ainda sofre o luto pela morte de seus filhos, enquanto Maria (Valdineia Soriano) e Reginaldo (Érico Brás) criam os seus, agora mais velhos e hiperconectados. A espinha dorsal da história, no entanto, está em Neuzão (Tânia Toko), cujo bar, ponto de encontro dos personagens, pode se tornar um restaurante de comida oriental. É a senha para a união, e todos resolvem reunir o dinheiro para que ela recupere o bar, com uma celebração no Dia de Iemanjá.
Esse reencontro com um gosto simultâneo de novidade e de familiaridade evoca sentimentos mistos. Por um lado, o filme é imediato em deixar claro que, sim, os anos passaram, uma nova geração está presente, e cada um daqueles personagens, à sua própria maneira, tocou à frente a própria vida. Por outro, existe essa necessidade de justificar uma continuação, da qual o carisma dos personagens somente não é capaz de dar conta. Ó Paí, Ó 2 sofre para responder com muita clareza a que veio, num amálgama bem intencionado de comentários sociopolíticos e culturais que vai criando pelo caminho uma variedade de subtramas, muitas delas resolvidas de forma convencional.
A execução da festa para o bar serve apenas de pretexto para a trama, e o que assume a posição central são minicrônicas da vida cotidiana no Pelourinho. Quando Joana resolve adotar três jovens em situação de rua, a discussão que se abre é de potencial riqueza, mas no caleidoscópio de urgências que o filme propõe para se atualizar isso não se aprofunda. Entre os muitos temas que pipocam na tela, há gentrificação, choque geracional, luto, sincretismo religioso, consequências econômicas pós-pandêmicas, roubo de propriedade intelectual, tentativas de romance.
Diante de tudo isso, e talvez para encontrar alguma solidez ou um norte nessa variedade de questões, não é de espantar que um ponto alto do filme retome ao lugar seguro da familiaridade: quando Roque se encontra e reverencia diversos ícones da arte e da cultura baiana — e a emoção de Lázaro Ramos nesse momento é palpável e natural.
Se tudo isso reunido serve como símbolo do poder da coletividade, mensagem que sempre foi cara não somente para a história de Ó Paí, Ó mas também para o Bando de Teatro Olodum, as saídas esquivas e simplórias que o roteiro encontra talvez deixem o espectador à deriva, em busca de um fio condutor que fortaleça seu laço emocional com esses personagens nesse reencontro. Há um carinho enorme envolvido nesse reencontro com personagens tão queridos e um olhar delicado da direção de Viviane Ferreira, mas o formato parece se encaixar mais nos palcos que na tela de cinema.